quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

O jogo das diferenças: o multiculturalismo e seus contextos


O jogo das diferenças: o multiculturalismo e seus contextos

Luiz Alberto Oliveira Gonçalves
Petronilha B. Gonçalves e Silva

          Os autores iniciam apresentando o tema do multiculturalismo, a partir da idéia de jogo das diferenças, que se constitui nas regras das lutas sociais para vencer o preconceito social, contra mulheres, negros e outros tipos de grupos marginalizados pela sociedade.
O objetivo do estudo é refletir sobre questões que envolvem a luta desses oprimidos, mostrando os múltiplos significados atribuídos ao multiculturalismo e a forma como esses significados mudam na dinâmica social.
          O tema do Primeiro Capítulo é O Multiculturalismo e seus Significados. Sobre esse tema é importante ressaltar o movimento das idéias, a partir da consciência coletiva e da pluralidade cultural, o que faz com que o termo divida posições.
Enquanto alguns se opõem, considerando o multiculturalismo uma proposta ingênua e leviana ou um estímulo à fragmentação da vida social, outros o defendem, atribuindo a ele a idéia de estratégia política de integração social. Outros ainda, acreditam que há uma cultura que se julga superior às outras e isso impede que exista de fato uma política multicultural.
          Não há como negar também a influência não apenas das instituições educativas, tais como escolas e universidades, mas também da mídia e veículos de comunicação, na forma como o multiculturalismo se apresenta à sociedade enquanto estratégia política.
          Embora os autores defendam que não é na escola que se deve buscar a origem do movimento social, mas na cultura de forma geral, não negam a importância da reflexão a partir das práticas educativas.
          Devido às diferentes visões com que se analisam o tema do multiculturalismo e, portanto, à dificuldade de se fazer uma leitura linear do movimento, os autores optaram por fazer um balanço sócio-histórico de como o  fenômeno multicultural se constitui como um dos princípios norteadores de políticas culturais.
          A origem do fenômeno multicultural se deu nos países em que a diversidade cultural é vista como um problema para a unidade nacional. Desse modo, processos autoritários impõem uma cultura dita superior a toda a sociedade. Assim, grupos, culturalmente dominados, diante da negação do direito de preservar suas características culturais, reagiram, exigindo reconhecimento e respeito a seus direitos, o que levou à emergência de movimentos multiculturais. Essa luta se ampliou a partir da segunda metade de nosso século, quando a reação utilizou-se das organizações políticas e na reivindicação de seus direitos civis.
          É importante pensar também sobre a forma como os jovens constroem suas identidades por meio dos movimentos culturais e da mídia, o que extrapola as fronteiras nacionais e cria novas linguagens e imagens entre a juventude, gerando o que os autores denominam ‘estetas do multiculturalismo’, tais como a etnomúsica e a imagem cinematográfica, que dão uma estética diferente às etnias.
          No Brasil, o processo multicultural aconteceu de forma bem diferente dos Estados Unidos. No Brasil prevaleceu a mediação de um Estado interventor, o que dissimulou o racismo e fez com que só recentemente os segmentos sociais se mobilizassem. Já nos Estados Unidos, onde o Estado é menos interventor, o multiculturalismo se transformou em um movimento de afirmações étnicas, mas também de conflitos sangrentos.
Diante dessa diferença, no Segundo Capítulo é apresentado o Estudo do Multiculturalismo e Educação nos Estados Unidos. Neste capítulo, os autores descrevem e analisam o multiculturalismo e a educação nos Estados Unidos, buscando com isso trazer uma contribuição para a reflexão e a tomada de decisões no Brasil.
Os conflitos entre os diferentes grupos postos à margem da sociedade e aqueles que se têm por hegemônicos forjam um contexto político e intelectual de questionamento das relações sociais. Tais conflitos se iniciaram nos anos 60 com a luta de líderes religiosos negros e estudantes e foram aos poucos atraindo outros grupos de cidadãos marginalizados. Líderes como Martins Luther King e Malcom X e grupos de Black Panther e Black Power incentivaram e impulsionaram o movimento negro em direção à resistência à opressão.
Aos poucos começaram a se destacar também outros tipos de movimento: feministas, dos deficientes, homossexuais, empobrecidos, grupos estes que conseguiram apoio das universidades e despertaram o interesse de trabalhos acadêmicos que foram chamados Black Studies. Trata-se de obras de professores negros, que passaram a constituir uma disciplina curricular exigida pelo Movimento Estudantil da Época (por volta de 1968). Essa inclusão no currículo incentivou outros grupos étnicos discriminados a promover reivindicações.
Assim vai surgindo a idéia de repensar a educação em uma perspectiva multiculturalista e de reconhecer e valorizar a importância da diversidade étnica e cultural, dando acesso a todos de oportunidades educacionais.
Essa preocupação se estende à formação de professores, já que desde os anos 70 se estabeleceram no país políticas públicas que visam a proporcionar iguais oportunidades de educação, integração e justiça social. Esse tipo de formação envolve, entre outras coisas, a oportunidade de oferecer aos professores experiências educativas que ajudem a compreender e valorizar as culturas e criticar injustiças sociais, além de realizar estágios em ambientes específicos e conviver com a cultura dos grupos com que trabalham.
A educação multicultural também tem sido alvo de críticas, sob duas tendências: extremista e conservadora. Para os conservadores, a ênfase nas questões étnicas cria separações e divisões. Para os extremistas, a educação multicultural incentiva a mobilização individual ao invés de criar uma mobilidade coletiva, capaz de realmente transformar a realidade. Estes últimos a censuram, ainda, por reduzir soluções para o problema ao âmbito da escola, reconhecendo a necessidade de uma crítica maior em relação aos sistemas de opressão.
Concluindo o capítulo, os autores consideram que compreender o multiculturalismo exige algumas ações necessárias:
- destrinchar referências ideológicas;
- elucidar encaminhamentos teóricos;
- descobrir práticas sociais;
- ressignificar práticas pedagógicas;
- posicionar-se politicamente
- situar-se socialmente.
O terceiro capítulo traz aspectos sobre O Multiculturalismo na América Brasileira. Desde o final do século passado, a sociedade brasileira se acostumou a representar-se com a imagem de paraíso racial. Essa imagem foi um mecanismo de dominação ideológica criada por elites brancas, o mito da democracia racial. Diferentes fatores concorreram para desmistificar essa imagem. Os primeiros foram as organizações negras que, a partir de final dos anos 40, começaram a se articular para reivindicar direitos iguais e exigir o mesmo tratamento dispensado aos imigrantes europeus.
Para que tal cenário se estabelecesse, entraram em cena fatores exógenos (externos) e endógenos (internos):  
- Fatores exógenos: contatos entre militantes negros brasileiros e estadunidenses, criando uma influência de idéias americanas no Brasil; criação da ONU e da UNESCO, o que pôs em cheque o suposto paraíso racial brasileiro, com a mudança de perspectiva introduzida por novas pesquisas.
- Fatores endógenos: conjuntura socioeconômica e política brasileira no período de 1940 a 1960, com o “pacto social” e a intervenção direta do Estado. Houve um esforço por parte do Estado brasileiro para enfatizar questões culturais e, com isso, transmitir a idéia de construir uma nova nação, uma identidade nacional. Em meio à aparente harmonia, surgiram as reações contrárias das organizações negras.
Desse modo, o movimento multicultural no Brasil foi ao mesmo tempo, um trabalho de conservação, inovação e valorização do patrimônio cultural afro-brasileiro.
Os autores definem o multiculturalismo no Brasil como algo que está com o alicerce posto, considerando as políticas multiculturais existentes e as parcerias entre universidades e secretarias estaduais e municipais de educação. Porém, a construção de uma sociedade multicultural democrática continuará dependendo da ação dos movimentos sociais.
Ao final do livro, são trazidos dados sobre os estudos culturais e pesquisas em educação no Brasil e, nesse contexto, são apontados alguns problemas e obstáculos a serem superados em relação ao multiculturalismo, tais como: falta de uma proposta clara que garanta uma formação permanente de professores nesse sentido, pouca produção na área da educação sobre os temas multiculturais, entre eles o espaço menor ainda ocupado pelos estudos sobre a mulher e, principalmente, a desigualdade na distribuição dos estudo multiculturais nos Programas de Pós-Graduação, que se concentra quase que totalmente (90%) nas regiões Sul e Sudeste.

GONÇALVES, L.A.O.;SILVA, P.B.G.  O jogo das diferenças: o multiculturalismo e seus contextos. 4.ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.

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